Letras

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quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

As unidades da língua.


A subteoria sobre as unidades da língua se constituiu na pedra de toque para seu entendimento como uma estrutura. O fonema* foi a primeira unidade a ser estudada.
Ele é uma entidade formal não observável diretamente, não audível, não definível por propriedades físicas, mas apreensível pelo falante como uma sorte de "forma psicologicamente real", por meio da qual ele percebe a "realidade objetiva dos sons":
Sapir (1933: 39). Assim, se consideramos pata e para como palavras diferentes, é por que os únicos elementos diferentes nessas palavras, o /t/ e o /r/, são para nós formas psicologicamente reais. O fonema é a unidade mínima da estrutura fonológica, e embora portador dos sentidos, por si mesmo não tem sentido.

O morfema* é a unidade mínima da estrutura gramatical, isto é, ele (e as demais unidades gramaticais) associa os dois polos do signo linguístico, o significante e o significado. Há morfemas-raízes, como em {fala}, morfemas afixos, como o morfema de tempo-modo {ra}, o morfema de pessoa-número {s}, que constituem a palavra falaras, morfemas suprassegmentais, como o acento, que nos permite distinguir falaras de falarás, e morfemas zero, como no presente do indicativo, em que depois do morfema-raiz não aparece um morfema de tempo, só o de pessoa-número, como em falo.

A palavra é unidade gramatical derivada do morfema, podendo realizar-se como um só morfema (como na preposição de), ou associar mais de um morfema (como em alunos], e funcionando como constituinte dos sintagmas (como em o aluno do professor).

O sintagma é a terceira unidade gramatical. Trata-se de um conjunto de palavras associadas pela propriedade da "constituência", tendo por núcleo a palavra que lhe vai dar o nome, e por margens outras classes de palavras de seleção previsível. Os sintagmas quando dotados de entoação própria podem funcionar como uma sentença, ou podem ser constituintes de uma sentença.

A teorização do fonema, do morfema e do sintagma representaram uma "construção pouco a pouco" do entendimento da língua como uma estrutura.

A inclusão da quarta unidade, a oração, mostrou-se muito trabalhosa. Ela é a unidade gramatical máxima, e em sua caracterização a Gramática Estruturalista encontrou suas maiores dificuldades, visto que a sentença soma em si um conjunto de estruturas fonológicas, morfológicas, sintáticas (sintagmática e funcional), semânticas e discursivas.

Se toma a língua como um código, tais estruturas deveriam ser analisadas a partir de suas propriedades "internas", sem pontos de contato com a situação de enunciação em que foram geradas. Daí a dificuldade de estudar estruturalisticamente a oração, o que acabou por levar a gramática estruturalista a uma grande crise.

Os níveis hierárquicos da língua

A teoria da língua como uma estrutura propõe que as unidades mencionadas
anteriormente se organizam em três níveis hierárquicos: o nível fonológico (= fonema),
o nível morfológico (= morfema, palavra) e o nível sintático (= sintagma e sentença). Alguns modelos estruturalistas mais recentes incluem o nível discursivo, como na Tagmêmica: K.L. Pike e E.G. Pike (1977: cap. I).

O caráter hierárquico desses níveis decorre de que, por postulação teórica, propriedades dos fonemas terão repercussões na constituição dos morfemas, propriedades destes terão repercussão na palavra, e assim por diante. Assim, a existência em português de dois fonemas vocálicos mediais (cf. a distinção entre [e] e [o] abertos e fechados) gerou o morfonema de gênero (cf. a distinção não afixal entre ele / ela), de número (cf. a distinção não afixal entre ovo / ovos) e de pessoa (cf. a distinção não afixal entre bebo / bebes). Significa que o nível fonológico, "inferior" num arranjo que vá das unidades mínimas para as unidades máximas, afeta o nível gramatical "superior" dos morfemas, fazendo da estrutura linguística uma sorte de "criação matemática" dos linguistas, "onde tudo está relacionado” (francês “où tout se tient"), para retomar a formulação saussureana.


Acesso em 17fev.2015.No texto Ataliba T. de Castilho (USP, CNPq).

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